segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Datas Especiais: 10 Anos sem Joey Ramone



Por Micael Machado e Ricardo Lira

Há exatos dez anos, em 15 de abril de 2001, falecia em decorrência de um linfoma (um tipo de câncer) Joey Ramone, vocalista dos Ramones, na cidade de Nova York, onde nascera 49 antes, a 19 de maio de 1951. Com ele, morria definitivamente a mais influente banda punk de todos os tempos, e uma das mais importantes da história do rock.

Nascido e criado em Forest Hills, no bairro do Queens, na mesma Nova York onde viria a perecer, Joey foi batizado como Jeffrey Ross Hyman, e foi uma criança tímida e introvertida. Bastante marcado pelo divórcio de seus pais quando tinha apenas nove anos, Joey estava constantemente doente, sofria de TOC (Transtorno Obsessivo Compulsivo), e não se relacionava com outras crianças de seu bairro ou escola. Graças à sua paixão pela música, principalmente pelos grupos vocais dos anos 60, como aqueles produzidos/criados pelo engenheiro de som Phil Spector, Joey acabou encontrando uma veia de escape para sua frustração  com seus problemas de saúde, sua timidez, sua aparência  e sua falta da habilidade para se relacionar com os outros.

Ramones, no Programa The Simpsons
Já adolescente, conheceu os New York Dolls e acabou se convertendo ao movimento Glitter, chegando a ser o vocalista de uma banda do estilo, o Sniper. Outra paixão do rapaz, os Stooges, o levou a conhecer John Cummings e Douglas Colvin, dois dos poucos garotos do Queens que também curtiam a banda. Motivados pelo sucesso dos Dolls, os três resolveram formar o seu próprio grupo, com John e Douglas nas guitarras (sendo que Douglas também cantaria) e Joey na bateria. Como Joey era muito alto e desengonçado, era difícil para que ele tocasse bateria. Assim, um amigo chamado Thomas Ederlyi sugeriu que Joey assumisse os vocais, enquanto Douglas passou para o baixo.

Johnny, Dee Dee, Tommy e Joey Ramone

Com o próprio Thomas assumindo a bateria, estava formada a primeira encarnação dos Ramones, nome escolhido devido ao apelido com que Paul McCartney se registrava nos hotéis durantes as excursões dos Beatles, e que os quatro assumiram como sobrenome. Surgiam assim Joey Ramone (vocais), Johnny Ramone (guitara), Dee Dee Ramone (baixo e vocais) e Tommy Ramone (bateria). A partir daí, foram 22 anos de estrada, 14 álbuns de estúdio, quatro ao vivo e diversas coletâneas que marcaram o papel do grupo na história da música.

Joey e Linda Ramone
Joey sempre foi considerado o "cara romântico" da banda, sendo dele as canções mais "tocantes" do repertório ramônico, como "I Want You Around", "She's A Sensation", "My My Kind of Girl", "Everytime I Eat Vegetables it Makes Me Think of You", "Can't Get You Outta My Mind" e outras, além de canções de protesto como "Censorshit", e outras exaltando os fãs do grupo, como "It's Gonna Be Alright" e "Touring". Joey também compôs "The KKK Took My Baby Away", sobre a sua namorada Linda, que o trocou por Johnny, vindo a casar com o guitarrista e permanecer a seu lado até a morte do mesmo, em 2004. Joey nunca superou o abandono, e a relação entre os dois membros da banda permaneceu estremecida até o final do grupo.

Joey também era ativo participante de campanhas sociais, a favor da legalização do aborto, dos direitos civis, contrário à administração Bush e pelos direitos dos animais. Já seu nêmesis e parceiro de banda, Johnny, era defensor do presidente Bush, tanto que, na cerimônia que conduziu o Ramones ao Rock and Roll Hall of Fame, em 2002, após uma apresentação cordial de Tommy Ramone para o público, Johnny se manifestou dizendo: "... and long life to president George Bush!" ("e vida longa ao presidente Bush"). Joey foi o único a fundar uma banda, chamada Resistance (com ex-membros da banda de Richard Hell e com Fred Smith, ex-Television) para participar de shows-protestos pelas causas que apoiava, enquanto Johnny nada teve como projeto após o término dos Ramones.

Tratados como semideuses na América do Sul (principalmente Brasil e Argentina), mas quase desconhecidos em seu país natal, os Ramones influenciaram toda a primeira geração do punk inglês em 1976, e inspiraram milhares de garotos a pegar nos instrumentos (mesmo sem saber tocar) e montar bandas de rock.

A lista de grupos que admitem a influência do quarteto é interminável, indo de mega nomes como U2 e Metallica até bandas que nunca saíram da garagem. O U2, em seus anos iniciais, tocava covers de "Glad to See You Go" e "I Remember You", enquanto o Metallica gravou, na época do álbum St. Anger (2003), vários covers da banda, como "We're a Happy Family", "Now I Wanna Sniff Some Glue" e "53rd & 3rd".

Jaquetas penduradas

Como citou Joey no essencial livro Barulho, de André Barcinski: "Quando eu era novo, os discos tinham 12, 14 faixas cada um. Em 1976, cada LP só tinha uma música de cada lado, com um monte de solos de guitarra e teclados insuportáveis. Nós reembalamos o rock, jogamos o lixo fora e começamos tudo de novo, do zero. Botamos só o que interessava: diversão, suor, emoção e energia".

Fato consumado em 22 anos de carreira e mais de 2,2 mil shows pelo mundo. Os Ramones ainda lançariam um último documentário ao vivo, chamado We're Outta Here (1997), registrando o último show da carreira (de número 2.263!), ocorrido no dia 6 de agosto de 1996, em Los Angeles. Além da mensagem mais do que clara do título, no encarte do CD consta uma foto com as jaquetas penduradas.

Agitando com os Ramones em 81
O incrível é que, mesmo sendo uma pessoa fragilizada e ficando constantemente adoentado durante as turnês, Joey permaneceu o membro mais ativo da banda. Nunca desistia de tocar com o grupo. Ele sabia da responsabilidade de ser um vocalista da banda punk mais venerada do mundo, e do significado que isso tinha para  seus fãs. Além disso, apareceram alguns tímidos projetos paralelos ao longo do caminho, como foi a maravilhosa canção que gravou com Holy Beth Vincent, "I Got You Babe", em 1982, e o Sibling Rivalry - projeto com seu irmão Micky Leigh, que rendeu um EP chamado In a Family Way (1994). Neste último caso, a temática fugia propositadamente do punk para faixas progressivas, puxando até para solos meio metal.

Ainda durante as atividades com os Ramones, era possível encontrar Joey Ramone em cima de um palco em algum pub de Nova York, cantando com seu projeto solo músicas como "What a Wonderful World" (este fato em particular aconteceu com um colega do Ricardo Lira em 1994, que por mais sorte ainda tinha uma câmera na mão e registrou parte do evento).

O ótimo documentário póstumo End of the Century (2003), apesar de focar essencialmente nos desabafos ramônicos sobre seus próprios integrantes, acaba mostrando a luta e passividade de Joey Ramone em meio aos turbulentos egos dos membros do grupo. De fato, a partir do final dos anos 80, quando Dee Dee parecia cada vez mais ausente no palco e já havia engatado um ridículo projeto rap, os Ramones precisaram ser reforçados em estúdio por músicos e produtores como Andy Shernoff e Daniel Rey, que conseguiram então dar ao disco Brain Drain (1989) toda a qualidade que haviam demonstrado no passado.

Joey em pose típica (1978)
Joey continuou se empenhando em escrever clássicas canções, enquanto Johnny praticamente não compunha mais. Joey e Dee Dee (até mesmo fora do grupo) foram os únicos a dar o fôlego que os álbuns dos Ramones com CJ Ramone (o novo baixista) precisavam. Estes álbuns tiveram o reconhecimento dos fãs, vendendo bastante e rapidamente chegando a disco de ouro no Brasil. Foi engraçado ver no documentário Johnny falando que não gostou de Mondo Bizarro (1992). Parecia muito contrariado com o disco, talvez pelo fato de não ter nenhuma composição sua no mesmo!

Continuando um pouco mais no documentário End of the Century,  acredito que o filme entrega os devidos créditos a Joey, não apenas porque ele havia falecido um ano antes, mas porque ele levou tudo adiante e participou das entrevistas até o final. E a paixão de Joey continuou, cantando músicas que os Ramones não tocavam , como "I Won't Let it Happen", em seus projetos solo. Em 1999, ele produziu o álbum She Talks to Rainbows (1999), de Ronnie Spector, e, em 2001, cantou pela última vez no álbum One Nation Under, do grupo Dine Navajo.

Quando Joey adoeceu, vindo posteriormente a falecer, a banda já estava separada, mas todos acreditavam em um retorno assim que o vocalista se recuperasse de sua doença, fato que infelizmente não aconteceu, vindo a frustar milhares de fãs e dando fim à minha banda favorita (Micael) em todos os tempos, os seminais Ramones.

Esquina do clube CBGB's com o nome de Joey

De qualquer forma, seu último suspiro artístico ficou registrado: o álbum solo Don't Worry About Me, contendo músicas compostas nas fases durante e pós-Ramones, e gravado enquanto o vocalista alternava idas e vindas ao hospital, com Daniel Rey e Marky Ramone como músicos de apoio. Depois de várias homenagens pelo mundo, a prefeitura de Nova York cedeu o devido tributo ao vocalista: a esquina do CBGB's, clube que abrigou os Ramones e muitos outros grupos punks desde os anos 70, recebeu o nome de "Joey Ramone Place".

Joey e um refresco (1998)
Particularmente, eu (Micael) lembro que a morte de Joey ocorreu em um ensolarado domingo de páscoa, o qual passei em minha cidade natal ao lado da minha família e da minha então namorada. Ao chegar de volta a Porto Alegre no final da noite e acessar a internet, tomei ciência do fato, e toda a alegria e bem estar do dia sumiram na mesma hora, tornando minha vida um pouco mais triste, pois era a confirmação de que meus maiores ídolos no mundo da música nunca mais tocariam juntos de novo.

Tive a sorte e a honra de ver o grupo ao vivo em 1994, em uma turnê conjunta com o Sepultura, onde o grupo me pareceu um pouco cansado e fazendo um show mais que burocrático. Mesmo assim, foi uma das melhores sensações que já experimentei em termos de show de rock, muito devido àquele vocalista alto e desengonçado, mas com um carisma enorme e uma alegria sempre evidente, Joey Ramone!

Joey Ramone usando sua tradicional jaqueta preta no programa "Fudêncio e seus Amigos"

Citando André Barcinski: "pro inferno com a dance music" (e o virtuosismo, acrescento eu)"o mundo precisa é de três acordes! Sem eles a vida fica bem menos divertida. Quem não entende, dane-se. Ou vá ouvir os discos dos Ramones!."

Descanse em paz, Jeffrey!

It's gonna be OK, it's gonna be alright...

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