quinta-feira, 24 de novembro de 2022

Datas especiais: 20 anos da primeira vez do Rush no Brasil

Por Micael Machado

Exatamente vinte anos atrás, em uma chuvosa noite de 20 de novembro de 2002, o trio canadense Rush se apresentava pela primeira vez no Brasil. E não, não foi no hoje famoso concerto do Rio De Janeiro que rendeu o DVD Rush In Rio pouco tempo depois, mas sim no hoje dilapidado Estádio Olímpico, na cidade de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. Mesmo passado tanto tempo, tenho certeza de que aquela  tarde/noite de quarta feira permanece marcada na memória da maioria das 35 mil pessoas que estavam lá, fazendo história junto com a banda em terras gaúchas.


Matérias em jornais locais repercutindo o show do Rush em Porto Alegre

Lembro que, para mim, foi o mesmo que a realização de um sonho. Eu uma época pré-internet, onde a maioria das informações sobre música chegava até mim através, basicamente, das revistas Bizz (depois ShowBizz) e Rock Brigade, em 2002 eu já curtia o Rush há pelo menos 12 ou 13 anos, desde que um amigo conseguiu a discografia inteira da banda (na época, até o álbum Presto) com alguém, com a promessa de devolver os discos no dia seguinte àquele em que os havia pego, o que me fez passar boa parte de uma madrugada e uma manhã e tarde inteiras de 1989 ou 1990 gravando os discos em fitas K7 sem nem mesmo ouvi-los antes, indo "curtir" e "entender" os mesmos a partir das fitinhas, nos dias subsequentes (experiência que, até hoje, me faz ter um pouco de medo da introdução de "Witch Hunt", faixa do disco Moving Pictures, depois de ouvi-la pela primeira vez às quatro da madrugada, nos fones de ouvido, num quarto escuro, com meu irmão dormindo ao lado e minha família em seus respectivos quartos, enquanto tentava manter o meu silêncio para não acordá-los, mesmo tendo experiências sonoras fascinantes à medida que a agulha percorria os sulcos de cada LP que ia para o toca discos... bons tempos...). Na verdade, eu já conhecia algo do grupo desde meados da década de 1980, quando "Spirit Of Radio" era tema do noticiário da TV estadual que passava na hora do almoço (e que, ainda hoje, se chama "Jornal do Almoço"), e, por isso, tocava bastante na rádio FM (e eu, que ouvia a música sem saber nada da banda, achava muito estranho o timbre de voz da "cantora" da banda... outros tempos)... e, claro, havia "Tom Sawyer", que era tema do seriado do MacGyver, que eu assistia religiosamente na TV nas sessões vespertinas da Rede Globo... Quando, anos depois disso tudo, os shows dos canadenses no Brasil foram anunciados, eu já tinha, não lembro como, o CD do Vapor Trails, álbum que a banda estava divulgando à época, e sabia que Peart havia passado por todos os problemas pessoais que hoje conhecemos bem, e que forçaram a banda a uma parada de quase seis anos, a qual quase acabou com a mesma. Sendo assim, a possibilidade de assistir ao vivo a uma banda tão importante para mim, já naquela época, era algo inimaginável, mas estava perto de acontecer.



Geddy Lee, Alex Lifeson e Neal Peart em Porto Alegre 
(fotos retiradas de uma reportagem da época sobre o show, disponível no Youtube)

Não lembro muito das horas que antecederam o show, mas lembro de ir ao estádio (que é muito perto de onde moro ainda hoje) e encontrar alguns amigos que haviam vindo do interior junto com meu irmão, e outras pessoas que estavam junto com eles. Juro que foi a primeira vez que vi alguém pronunciar "uái uái zí" para se referir a "YYZ" (que, para mim, sempre havia sido "ípsilon ípsilon zê"), e "twenty-one twelve" para se referir a "2112" (que, obviamente, eu sempre havia chamado de "dois mil cento e doze"), mesmo que meus conhecimentos de inglês não fossem tão limitados assim à época. Outra dúvida pertinente entre o pessoal era a pronúncia do sobrenome do baterista: seria "Pírt" ou "Pãrt"? Lembro também que a expectativa de todos era enorme ("Quais músicas será que vão tocar? Será que rola "Hemispheres"?), especialmente pelo solo de Peart, que, todos sabíamos de antemão, seria sensacional. Curiosamente, não lembro de ter encontrado o Mairon (que foi com sua esposa à época ao show, e ficou afastado de mim durante o mesmo, junto dela), mas sei que nos falamos antes do show, e, rapidamente, por telefone, após o mesmo...

As lembranças de momentos específicos do espetáculo também não são claras para mim... lembro mais das sensações da data... a "pista VIP", na frente do palco, era separada da "pista comum" por uma grade muito baixa, e tinha cadeiras em sua extensão. O pessoal da VIP começou a subir nas mesmas, o que dificultou a visão para quem, como eu, estava na "pista comum". Fora que o pessoal da "comum", não entendendo por qual motivo estava tão "para trás", tentava forçar a passagem à frente, talvez por não ver a grade, e espremia cada vez mais contra a mesma aqueles que estavam próximos à grade de separação, como eu. A primeira parte do show eu fiquei tão desconfortável que, no intervalo (foram quase três horas de apresentação, separadas por um intervalo de vinte minutos, como seria tradição dali para a frente nos concertos da banda, mas era algo quase inovador à época), eu me forcei a sair da minha posição e tentei ir mais para trás no gramado, mas o pessoal, aglomerado em suas posições, acabava dificultando minha passagem, mesmo que, teoricamente, eles fossem ficar mais perto do palco do que onde estavam... foi algo que achei bastante estranho na época, e me fez perder parte do vídeo de introdução da segunda parte, mas não escapar do calor do fogo "lançado" pelo dragão da animação por sobre o público das pistas no início de "One Little Victory" (quem estava lá deve saber do que estou falando)...

Neil Peart relaxando no antigo Estádio Olímpico, momentos antes do show de 20 anos atrás

Foram muitos momentos de puro embasbacamento musical assistindo aqueles três gênios naquele estádio. Desde a abertura com a conhecidíssima "Tom Sawyer", passando pelo êxtase coletivo em "YYZ" (que, ao que lembro, não teve o pessoal cantando as linhas instrumentais, como ficaria eternizado no DVD do show do Rio), minhas surpresas com as execuções de "The Trees", "Freewill" e, principalmente, "Natural Science" (três de minhas faixas favoritas da carreira da banda, e que a falta de informações que existia à época não me fazia sequer supor que a banda fosse tocar), a minha alegria com "Driven", que eu sempre gostei muito, mas que o pessoal parecia não conhecer direito, e, claro, o espetacular solo de bateria de Peart, ainda hoje não superado em técnica, emoção e sentimento por nenhum outro baterista que eu já tenha assistido ao vivo (quem presenciou algum show da banda em alguma turnê, sabe do que estou falando). Afinal, como alguém já escreveu, depois de presenciar um solo de Peart ao vivo, deveria ser proibido a qualquer outro baterista de rock de fazer um solo em show, sob o risco de passar vergonha perto do que este saudoso mestre fazia. Quem viu, há de concordar!

O final do show trouxe mais momentos marcantes, com "La Villa Strangiato" (outra faixa que adoro) e "Spirit Of Radio", que todos ali conheciam bem demais, e o bis ainda trouxe "By-Tor e Snow Dog", a introdução da primeira parte de "Cygnus X-1" e "Working Man", mas, confesso,não lembro bem da execução destas, ao contrário de boa parte das demais, as quais posso revisitar com frequência, graças a outro fato inusitado para aquela época: poucos dias depois do show, o dono de uma loja de discos da cidade, que eu frequentava com bastante regularidade, me informou que possuía uma gravação pirata do show, feita da plateia não sei como e não sei por quem. Era o hoje "famoso" CD Porto Alegre Trails, que muitos à época compraram, e que eu, claro, também adquiri. Ouvindo hoje, acostumados aos recursos digitais que possuímos, a gravação pode ser considerada como "horrível": há muito barulho de vento nas músicas, falas do público entre as mesmas, e, algo que não soube por anos (a internet foi quem me "contou", já na década seguinte): o repertório está incompleto (faltam "Closer To The Heart", que a banda incluiu no repertório da turnê apenas nestes shows brasileiros, ao que eu sei, a própria "Natural Science", e todo o bis). Mesmo assim, considerando-se que, à época, não se conseguia entrar nos shows sequer com uma câmera fotográfica analógica (com filme de rolo!), o fato de alguém ter gravado, de forma relativamente decente, praticamente toda a apresentação, e ter a possibilidade de ouvir a mesma vinte anos depois com uma qualidade de certa forma aceitável, como consigo hoje, chega perto de ser surreal (não são muitos os registros de shows da época que se encontram por aí, ainda mais os acontecidos em Porto Alegre, que, já na época, não era assim tão "prioritária" em termos de rotas para shows em turnês nacionais,algo que melhorou "um pouco" atualmente).


Lembranças e memorabilias do show de 20 anos atrás

Dois dias depois, o trio se apresentaria em São Paulo, e, no sábado, 23 de novembro, acontecia o histórico show registrado no DVD (e hoje também disponível em CD e vinil - eu tenho os três formatos). Alguns anos depois, em 10/10/2010, tive a oportunidade de assistir ao grupo mais uma vez, daquela feita no Rio de Janeiro, na turnê Time Machine Tour. Mas as circunstâncias eram completamente diferentes, e aquela primeira vez no Olímpico ficaria marcada para sempre nos presentes àquela data tão especial, mesmo vinte anos depois. E, creio eu, ainda vai ficar por muito tempo ainda!


Capa e Contracapa do CD Porto Alegre Trails

Set list:

Set 1:

Tom Sawyer

Distant Early Warning

New World Man

Roll the Bones

Earthshine

YYZ

The Pass

Bravado

The Big Money

The Trees

Freewill

Closer to the Heart

Natural Science

Set 2:

One Little Victory

Driven

Ghost Rider

Secret Touch

Dreamline

Red Sector A

Leave That Thing Alone

Drum Solo

Resist (acoustic)

2112 Part I: Overture

2112 Part II: The Temples of Syrinx

Limelight

La Villa Strangiato

The Spirit of Radio

Encore:

By-Tor & The Snow Dog

Cygnus X-1 (Prologue)

Working Man



sexta-feira, 11 de novembro de 2022

Camisa de Vênus - Duplo Sentido [1987]


Por Micael Machado

Há uma série de postagens aqui no site onde o nosso colaborador Mairon Machado associou um disco do chamado BRock dos anos 1980 para cada um dos sete pecados capitais. Como a ambição não faz parte da lista de "pecados maiores" condenáveis pela Igreja Católica, acabou ficando de fora daquela relação, mas, se um disco do período tivesse de "encarnar" este sentimento, não haveria, na minha opinião, um álbum mais adequado do que Duplo Sentido, último registro da formação clássica do grupo baiano Camisa de Vênus, composta então por Marcelo Nova nos vocais, Karl Hummel e Gustavo Mullem nas guitarras, Robério Santana no baixo e Aldo Machado na bateria. Os motivos para eu fazer esta afirmação são, pelo menos, três: em primeiro lugar, obviamente, por ser um disco em vinil duplo, o primeiro (e um dos únicos) deste tipo naquela geração do rock brasileiro, pois a Legião Urbana, por exemplo, só veio a ter seu "duplo" (a compilação de apresentações ao vivo Música Para Acampamentos) lançado em 1992, e grupos como Titãs, Paralamas do Sucesso, Engenheiros do Hawaii, Ultraje A Rigor ou Ira! nunca tiveram LPs editados neste formato; em segundo, pela imensa quantidade de convidados especiais que participam ao longo das dezessete faixas do álbum, indo de ícones como Raul Seixas (que dispensa apresentações), Manito (à época já ex-membro de grupos como Os Incríveis, Som Nosso de Cada Dia e Mutantes, e que depois ainda viria a gravar com o Ultraje A Rigor e a Patrulha do Espaço, dentre outros) ou Luiz Carlos Batera (percussionista que tocou com gente do porte de Tim Maia, Caetano Veloso e Gilberto Gil, além de ter feito parte da Banda Black Rio), além de músicos reconhecidos nacionalmente, como o pianista Sérgio Kaffa (que, dentre outros, tocou com gente como Sá & Guarabyra, O Terço, Cezar De Mercês e Arnaldo Baptista), o também pianista Paulo Calasans (que já acompanhou artistas do porte de Djavan, Gal Costa, Gilberto Gil e Roberto Carlos, entre outros), o músico e ator Chiquinho Brandão (que, dentre outros, acompanhou Elis Regina ao vivo em parte de sua carreira), os gaitistas Ricardo Henrique e Mica Griecco, além das "backing vocalistas" Vera Natureza, Maria Aparecida de Souza (Cidinha), Rita Kfouri e Nadir, e da própria esposa de Marcelo Nova à época, Inez Silva. O terceiro motivo, e, para mim, o mais importante, é a imensa variedade de estilos musicais que o quinteto abrange nos quatro lados do LP.

Conta a lenda (e Marcelo confirma no excelente livro O Galope do Tempo, de André Barcinski), que o cantor ficou muito decepcionado com as atitudes e posicionamentos de alguns dos membros do grupo após o estrondoso sucesso de Correndo o Risco, terceiro disco do Camisa, lançado em 1986, e que vendeu, à época, quase trezentas mil cópias, levando o quinteto ao primeiro patamar do Rock Nacional de então (o tão falado BRock). Decidido a partir para uma carreira solo onde pudesse fazer algo diferente do que vinha gravando com a banda, Marcelo comunicou a decisão de sua saída do Camisa a seus colegas ainda antes do início das gravações para o que viria a ser  Duplo Sentido. Como os baianos ainda deviam dois discos para sua gravadora à época, a Warner, o próprio cantor se reuniu com o diretor André Midani para explicar que a banda estava se dissolvendo, e propor um álbum duplo para cumprir o acordo ainda pendente com o selo. Com a aceitação dos termos pelo executivo, e como não havia a pressão de ter de  superar as vendas do disco anterior, visto que a banda iria acabar de qualquer forma, os músicos, a meu ver, pareceram se ver livres para explorar várias de suas ambições musicais naquele que seria, então, seu último registro. Pelos sulcos do vinil original, passamos pelo "rock de FM" tão comum à época, na forma de músicas como "Muita Estrela, Pouca Constelação" (primeira parceria de Marcelo Nova com Raul Seixas, que participa como cantor na faixa, a qual chegou a ser lançada como compacto simples à época - vale lembrar que Marceleza e Raulzito gravariam posteriormente A Panela do Diabo, que, inclusive, representou a "preguiça" naquela série dos pecados citada lá no início do texto), "O País do Futuro" (que ganhou clipe e boa repercussão nas rádios naquele ano, além de contar com a percussão de Luiz Batera e uma temática na letra que, infelizmente, soa relevante ainda hoje) ou "Vôo 985"; rock and roll tradicional ("Chamam Isso Rock and Roll", para mim, uma das melhores letras da carreira do grupo, recheada por solos de gaita e sax, este a cargo de Manito, e cujo ritmo vai ganhando velocidade à medida que o arranjo se desenvolve); rocks mais "agitados" como "Lobo Espiatório" (com letra em solidariedade ao músico Lobão, à época constantemente perseguido pela polícia, e que abre com falas de Al Pacino retiradas do filme Scarface) ou "Ana Beatriz Jackson" (cuja temática da letra, muitos apontam, lembra a de "Billy Jean", de Michael Jackson); ecos da origem punk da banda (em "Após Calipso", que conta com inusitados solos de flauta, sax e violino a cargo de Manito); algo do pós punk reinante em certos períodos dos anos 1980 (em "O Suicídio Parte II", que retoma a temática lírica de "Pronto pro Suicídio", do autointitulado disco de estreia da banda, e na instrumental "Chuva Inflamável", a segunda deste formato lançada pela banda em toda a sua carreira - sendo a primeira uma versão para o tema da Pantera Cor de Rosa presente no segundo disco, Batalhões de Estranhos, de 1985); balada romântica acústica ("Deusa da Minha Cama", outra que conta com a percussão de Luiz Batera, e com a rápida participação da esposa de Marcelo em um "Bom Dia" falado em seu início); blues (na excelente "Me Dê uma Chance", um blues "rasgado" interpretado ao vivo no estúdio, e permeado por solos tanto de guitarra como de piano, por Paulo Calasans, sax, a cargo de Manito, e gaita, a cargo de Mica Griecco); e até uma versão moderna do tango argentino, em "O Último Tango" (que conta com Chiquinho Brandão no serrote).

Robério Santana, Aldo Machado, Gustavo Mullem e Marcelo Nova "apresentando" seu último registro juntos

No lado D, naquele que seria o último lado de um disco de vinil da banda ainda hoje (visto que os álbuns lançados após a "volta" do Camisa não foram editados neste formato), uma seleção de covers escolhidos apenas "para preencher o disco", como Marcelo coloca no livro citado acima. Se a correta e quase literal versão para "Aluga-se", de Raul Seixas (que inicia com o famoso "bordão" "Brasileiros e Brasileiras", do então presidente José Sarney) ou "A Canção do Martelo" (versão em português para "Hammer Song", da The Sensational Alex Harvey Band, que ficou ainda mais soturna que a sombria versão original, além de contar com um excelente solo de Órgão Hammond por parte de Manito) não chegam a ser surpresa para quem conhece os gostos musicais de Marceleza, também não o deveriam ser escolhas como "Farinha do Desprezo", de José Carlos Capinam e Jards Macalé (afinal, o Camisa já havia gravado "Gotham City", dos mesmos autores, no Batalhões de Estranhos), a qual, neste disco, ganhou tons de punk rock inusitados perto da acústica e "balançante" versão original, "Enigma" (composta por Adelino Moreira, a qual teve letra alterada por Marcelo, e também ganhou uma sonoridade quase punk), canção que ficou famosa na voz de Nelson Gonçalves (sendo que o Camisa já havia gravado no essencial Viva uma versão para "My Way", consagrada na voz inigualável de Frank Sinatra - e seria assim tão absurdo afirmar que Nelson Gonçalves é o equivalente brasileiro de Sinatra? Então, por que não gravá-lo em um disco de uma banda como esta?) ou "Canalha", de Walter Franco, outro artista que Marcelo sempre disse admirar (vale citar que a versão do Camisa, um rock agitado e "pegado", soa para mim muito superior àquela que os Titãs registrariam décadas depois no disco Nheengatu. Curiosamente, os mesmos Titãs também gravariam, anos depois do Camisa, uma versão para "Aluga-se", assim como os baianos fizeram neste disco aqui - e, para mim, com resultados também inferiores).

Segundo Marcelo, no livro citado acima, o disco "foi gravado num clima melancólico. Os integrantes da banda não se encontravam no estúdio (para gravar) ... e depois o Peninha foi juntando as partes (registradas em separado por cada músico) para completar o disco", referindo-se ao lendário produtor Pena Schmidt, um dos principais responsáveis por muitos dos discos de sucessos lançados pelo BRock naquela década, e que ficou com a "batata quente" nas mãos de produzir este registro que, ainda de acordo com Marceleza, seria "triste, melancólico, de final de etapa. Ali não tinha mais nada, só um contrato a cumprir". Apesar das palavras do vocalista, eu não o considero assim. Há, para mim, momentos muito interessantes ao longo de sua audição, e é inegável que o Camisa encontra-se em seu momento mais maduro, tanto musical quanto liricamente falando, no momento da gravação deste último registro. Eu quase incluí este disco na categoria dos "Discos Que Parece Que Só Eu Gosto" aqui do site, mas, honestamente, dos cinco registros da primeira fase dos baianos (os quatro de estúdio mais o fantástico ao vivo), este talvez seja o que menos me atrai, justamente por causa de sua pluralidade de estilos, que, a meu ver, deixam o álbum como um todo meio sem foco, sem direção, com boas e excelentes canções ao lado de outras que não me atraem tanto.


Contracapa da versão original em LP

Talvez o público da época tenha pensado o mesmo, pois o disco vendeu muito pouco (não consegui encontrar um número preciso, mas alguns sites falam em 40 mil cópias vendidas, quantidade muito abaixo das 300 mil do disco anterior), sem ter propriamente uma turnê de divulgação para ele (apenas algumas poucas entrevistas e outros poucos shows, sendo que um deles, no Ginásio do Ibirapuera em São Paulo, inclusive foi transmitido pela TV Cultura na época, e hoje encontra-se disponível no youtube), com este álbum duplo nunca tendo o reconhecimento que merece, aparentemente, nem mesmo por parte da banda. Tanto que, quando do "retorno" em 1995 (sem Gustavo e Aldo, que culminou no disco Quem É Você?, do ano seguinte), ou no show de 2004 que rendeu o DVD Ao Vivo No Festival De Verão Salvador (apenas com Marcelo, Karl e Gustavo da formação original), ou ainda na "volta" á ativa em 2015 (apenas com Marcelo e Robério), que já rendeu discos de estúdio e ao vivo, apenas a faixa "Muita Estrela, Pouca Constelação" acabou sendo lembrada nos palcos, com o grupo (ou seria apenas Marceleza?) desprezando totalmente as demais composições de seu "último registro". Uma pena, pois é um álbum que merece ser redescoberto, ainda mais agora que está próximo de completar 35 anos de idade (a serem "festejados" agora em outubro, em data incerta, segundo a página da wikipedia). E você, está disposto a dar mais uma chance a este registro de duplo sentido?

Track List da versão original em LP:

Lado A:

01. Lobo Espiatório

02. O País do Futuro

03. Ana Beatriz Jackson

04. Vôo 985

05. Após Calipso

Lado B:

01. Me Dê uma Chance

02. Deusa da Minha Cama

03. Chamam Isso Rock and Roll

Lado C

01. Muita Estrela, Pouca Constelação

02. O Último Tango

03. O Suicídio (Parte II)

04. Chuva Inflamável

Lado D

01. Enigma

02. Farinha do Desprezo

03. A Canção do Martelo

04. Aluga-se

05. Canalha