domingo, 3 de dezembro de 2023

Belgrado – Intra Apogeum [2023]


Por Micael Machado

Sete anos se passaram desde Obraz, o disco mais recente até então do grupo espanhol Belgrado, e não foi apenas a formação do grupo que mudou. Se o guitarrista Fer agora prefere assinar seu nome como Fernando Marquez (além de ter passado a cuidar também dos sintetizadores) e se o antigo baixista Renzo Narvaez cedeu seu lugar para Louis Harding já na turnê de promoção daquele trabalho, foi a troca da bateria pelos teclados feita pelo ex-percussionista Jonathan Sirit quem causou o maior impacto na sonoridade da banda, visto que sua antiga função passou a ser exercida por uma bateria eletrônica, também operada por Sirit. Sendo assim, a música do quarteto (completado pela vocalista polonesa Patrycja Proniewska), que antes parecia um pós-punk vindo diretamente de 1980 ou 1981, parece ter "avançado" alguns anos no tempo, e, neste Intra Apogeum ("Apogeu Interno", em polonês), soa como uma mistura de pós-punk com algo do estilo new romantic, em um disco que parece ter sido gravado ali por 1983 ou 1984, e engavetado por todo esse tempo em algum arquivo "perdido" do selo La Vida Es Un Mus, responsável por este lançamento (no caso do Belgrado, com edições em vinil e, pela primeira vez em sua discografia, também em CD), assim como pelos  três registros anteriores do conjunto.

E não é só o estilo musical das novas músicas que remetem aos anos 1980. Os timbres dos teclados e os efeitos eletrônicos (que quase soam datados neste século XXI) escolhidos por Jonathan, além dos padrões de programação selecionados para a bateria eletrônica (elementos todos que já aparecem logo de cara na faixa de abertura "Boixar", que ganhou clipe  é um dos destaques do álbum) e a própria produção do disco passam essa impressão. "Nie Zapomnę", outra que ganhou clipe, conta com um baixo com bastante "groove", e é uma composição em mid-tempo totalmente oitentista, assim como a dançante "Tęsknota".  Os teclados de "Rytmy Wszechświata" a tornam uma das faixas mais pop da carreira da banda, "título" que também pode ser "reclamado" pela agitada  "Tu I Teraz".

Belgrado em 2023: Jonathan Sirit, Patrycja Proniewska, Fernando Marquez e Louis Harding

Com mais de seis minutos, "Elementy Umysłu" tem um começo climático, que descamba em uma faixa que parece saída diretamente das sessões do The Cure na fase que resultou na coletânea Japanese Whispers, com uma sonoridade dançante, mas que carrega ainda alguns toques de melancolia, sentimento que também aparece em "Na Szlak", embora a sonoridade dos teclados apague um pouco esta sensação, além desta ser a única faixa do registro a contar com uma frase na letra que não é cantada na língua polonesa (no caso, o espanhol de "Ni un minuto más", repetido por Pat no final da canção). Já a faixa título, que também fecha o álbum, parece fazer mais claramente o elo que une o passado (graças ao baixo e à sonoridade da guitarra) e o presente (representado pela programação da bateria e pelos timbres de teclado) da sonoridade do Belgrado.

Fer continua enchendo sua guitarra de efeitos que remetem à época áurea do pós-punk britânico do começo da década de 1980, além de continuar econômico nos solos, que, aqui, aparecem ainda menos que nos discos anteriores. O baixo de  Louis também permanece fiel à sonoridade daquela época, soando bem "na cara" dos ouvintes, e, assim como em registros anteriores, continua sendo a característica do som do grupo que mais o aproxima de grupos como Joy Division ou Sisters of Mercy. Já Pat continua cantando apenas em sua língua natal  (com exceção da citada "Na Szlak" - as letras em polonês estão todas lá no encarte, para quem se habilitar a ler aquelas palavras tão cheias de consoantes e tão escassas de vogais), mas agora aparece ainda mais contida em seus excessos vocais do que no álbum anterior, no qual já havia reduzido bastante seus "gritinhos" e "intervenções" que, convenhamos, causavam bastante estranheza quando apareciam em quantidades maiores nos dois primeiros discos do quarteto.

Contracapa de Intra Apogeum

Os pouco menos de trinta e sete minutos de Intra Apogeum pode até ser o ápice interno da banda, como seu nome sugere, mas, externamente, causará bastante surpresa nos mais desavisados que já tiverem ouvido a encarnação anterior do Belgrado antes deste novo registro. Como a sonoridade mais pop e dançante daquela metade da década oitentista nunca soou como ofensa aos meus ouvidos, eu gostei bastante do álbum, mas confesso que prefiro a sonoridade mais "crua" e focada no pós-punk dos discos anteriores. Coisa de gosto, apenas.

Track List

1. Boixar

2. Rytmy Wszechświata

3. Nie Zapomnę

4. Tu I Teraz

5. Elementy Umysłu

6. Tęsknota

7. Na Szlak

8. Intra Apogeum