Por Micael Machado
Sou fã dos Engenheiros do Hawaii desde a primeira vez que ouvi "Toda Forma de Poder" na trilha sonora da novela Hipertensão no distante 1986. Tenho todos os discos e DVDs da banda, além dos lançamentos dos trabalhos paralelos de Humberto Gessinger, líder e "dono da bola" do grupo (Humberto Gessinger Trio e Pouca Vogal).
Ao contrário de muitos que acham Humberto pretensioso, metido a fazer frases intelectualóides e falsamente inteligentes, sempre curti as letras do principal compositor dos Engenheiros. Não que o considere um "poeta maior" da língua portuguesa (coisa que muitos fãs afirmam com paixão), mas o acho um grande frasista com várias sacadas inteligentes e interessantes espalhadas em seus quase trinta anos de carreira musical.
Por isso, quando tive a oportunidade de adquirir Pra Ser Sincero: 123 Variações Sobre um Mesmo Tema, segundo livro do portoalegrense (o primeiro é Meu Pequeno Gremista, de 2008), o fiz com satisfação. Esperava encontrar no Humberto escritor, o mesmo talento do cantor, multiinstrumentista e compositor cujas composições me acompanham há tanto tempo. Não foi bem assim...
A contracapa anuncia: "Humberto Gessinger lança neste livro um olhar sobre sua trajetória e revela curiosidades sobre sua carreira. Com fotografias inéditas, informações sobre cada um dos discos e letras comentadas". Tudo isso está lá, mas a propaganda é muito melhor do que o produto. Dividido em três partes, o livro deixa uma sensação de desperdício de espaço e não atende às expectativas geradas.
Contracapa do livro
Começando pelo "olhar sobre sua trajetória". Humberto repassa sua carreira desde sua infância até o trabalho ao lado de Duca Leindecker no Pouca Vocal, passando inevitavelmente pela trajetória dos Engenheiros do Hawaii. O texto é muito bem escrito, fácil de ler e recheado daqueles trocadilhos tão caros à Gessinger que seus fãs (eu incluso) parecem adorar. As páginas são recheadas de fotos, muitas delas exclusivas. No entanto, tudo é muito superficial, muito rápido. Nada é tão detalhado quanto esperava o ávido fã-leitor. Embora alguns aspectos "de bastidores" sejam revelados pela primeira vez, fica a sensação de que muito mais poderia ter sido dito. Muitas coisas, que gostaríamos de saber, ficam sem ver a luz. A conturbada saída de Augusto Licks do grupo (o guitarrista deixou os Engenheiros com várias discussões pela imprensa, um rompimento que gerou até processos) é tratada assim por Humberto: "Augustinho saiu da banda. Brigamos sem brigar, cada um foi ficando no seu canto. A culpa deve ter sido minha". Muito simples para explicar tudo o que ocorreu. Assim como a descrição de vários outros pontos da trajetória dos gaúchos.
O período de cada disco é marcado por, ao menos, duas páginas dedicados ao mesmo com capas e contracapas de cada álbum, relação das músicas e seus compositores, além de um breve comentário de Humberto sobre algum fato relevante do período. Há também indicações das participações especiais que o líder dos Engenheiros fez em outros projetos, um resumo bastante interessante de sua trajetória.
Após duas páginas com diversas capas de cadernos culturais estampadas pelos projetos de Gessinger ao longo dos anos, chegamos à segunda parte do livro: as "letras comentadas". Cento e vinte e três letras (uma quantidade escolhida, segundo o autor, porque ele "encasquetou com o número") são reproduzidas em ordem cronológica. Muitas delas inéditas e algumas merecendo um breve comentário de Humberto sobre seu significado, o motivo de sua composição ou sobre outros aspectos que interessam à Humberto e, possivelmente, a seus fãs. Interessantes nesta parte são as gravuras representando as diversas fases do líder dos Engenheiros. A maioria de autoria da dupla Andrews & Bola.
A terceira e última parte, apesar de ser a mais curta, é a mais desgastante. Nela, o respeitado escritor gaúcho Luís Augusto Fischer faz uma espécie de síntese da trajetória de Humberto Gessinger e de seu significado, tanto para si como para a música brasileira. Pelo menos, foi o que consegui entender deste trecho, pois a linguagem extremamente rebuscada e cheia de metáforas utilizada por Fischer (quem acha os escritos do vocalista complicados precisa com urgência ler esta parte para mudar de ideia) torna a leitura cansativa, de difícil compreensão, fazendo com que voltemos ao mesmo trecho duas ou três vezes para conseguirmos assimilar o que está escrito. O que poderia ser uma bela homenagem (e acho que foi esta a intenção) acabou se transformando em algo pretensioso, desnecessário e que destoa bastante do clima e do ritmo dos trechos escritos por Humberto.
Em resumo... Não é um livro que agradará a todos os fãs dos Engenheiros e, certamente, não conseguirá cativar aqueles que nunca gostaram da obra de Humberto Gessinger. Tem vários pontos de interesse, mas não consegue ser um livro essencial para sua estante. Uma pena!
Pra quem gosta de nós é um prato cheio... Nem tanto!
O autor e sua obra
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