Por Micael Machado
Quando o Body Count surgiu, no começo dos anos 90, causou sensação por ser uma banda de heavy metal liderada por um rapper (o já então reconhecido Ice T), além de ser formada apenas por músicos negros. Seu primeiro disco, autointitulado (1992), além da grande qualidade musical, ganhou notoriedade pela polêmica gerada pela canção “Cop Killer”, espécie de resposta aos policiais que assassinaram brutalmente o jovem Rodney King em 03 de março de 1991 na cidade de origem do grupo, Los Angeles, sendo que esta morte acabou gerando um dos maiores tumultos já vistos na história daquela metrópole. O disco acabou sendo censurado, e uma nova versão foi lançada sem “Cop Killer”, substituída por um discurso de Jello Biafra (ex-vocalista dos excelentes Dead Kennedys) a favor da liberdade de expressão.
Com o nome reconhecido, o BC lançou seu segundo disco , Born Dead, em 1994, e manteve a notoriedade conquistada. Logo após o terceiro álbum, Violent Demise: The Last Days (1997), ser completado, o baterista Beatmaster V morreu vítima de leucemia, e o baixista Mooseman (que havia deixado o grupo pouco antes das gravações do disco) foi vítima de um tiroteio nas ruas de LA, falecendo também.
Abalado por estas tragédias, e também pela fraca repercussão do seu então novo lançamento, o grupo decidiu “dar um tempo”, retornando para uma excursão em 2003 e preparando-se para lançar seu quarto álbum. Foi nesta turnê, ao longo de várias cidades dos Estados Unidos durante o ano de 2004, que o DVD Murder 4 Hire foi registrado. Olhando-se a capa e a lista de músicas constantes nela, pode parecer uma boa ideia o fã do grupo adquirir o mesmo. Mas, como diz a letra de um dos clássicos do BC, “infelizmente, a merda não é bem assim”...
Body Count: Vincent Prize, O.T., Ice T, Ernie C e D-Roc
Com Ice T nos vocais, os guitarristas Ernie C e D-Roc (os outros membros originais remanescentes, ao lado do vocalista), Vincent Prize no baixo e O. T. na bateria, Murder 4 Hire já começa errado pelo conceito adotado. Ao invés de focar-se em um show do BC, o DVD apresenta imagens gravadas em diversos locais dentro da mesma música, tirando aquela sensação de continuidade que pelo menos eu gosto de ter quando assisto a um vídeo musical. Em uma cena Ice está de boné, na outra de bandana, na outra sem nada na cabeça, ou Ernie está vestido de preto, depois de branco, depois sem camisa... fica tudo meio confuso, embora o áudio seja sempre de uma mesma apresentação.
E este áudio é o maior problema do DVD. Você vai escutando a primeira música (um medley de “Body Count’s In The House/Body MF Count/Masters Of Revenge”, embora na capa conste apenas “Body Count’s In The House”) e logo fica a pergunta: cadê a guitarra de Ernie C? Em certos registros, um ou outro instrumento mais baixo em relação ao contexto geral até é aceitável, mas em um DVD de havy metal, a falta da guitarra solo é algo bizarro! A guitarra até está lá, escondidinha na mixagem, mas é estranho você ver Ernie fazendo caras e bocas ao se contorcer para tocar (e muito!) o seu instrumento, e não ouvir o som do mesmo. A bizarrice se prolonga por todo o DVD, numa falha de edição imperdoável. Além disso, várias músicas aparecem editadas, então você está lá curtindo o som, e de repente, do nada, a música some e entra uma entrevista. Inacreditável!
Cada música (ou parte) é sucedida por uma entrevista. Todos os membros falam sobre a sua história pessoal, sobre o seu envolvimento com a banda (Ice e Ernie contam fatos bastante interessantes sobre o início do BC, sendo mostrado até um pedacinho de um vídeo da época em que o grupo era apenas a banda de apoio para as performances do então rapper Ice T), sobre a turnê e sobre diversos outros assuntos. Até Jello Biafra aparece em certo trecho falando sobre a sua relação com o Body Count, além de apresentar o quinteto em um festival ao vivo. Para quem é fã (como eu), tem muita coisa atraente, mas fica aquela sensação de “muito papo e pouca música”, sendo que o tempo de falatório poderia ter sido substituído por mais canções. Pelo menos, nestas partes constam legendas, embora em português de Portugal (o que gera certas expressões que não usamos no Brasil), e feitas por um sujeito que, com certeza, não conhece a banda, nem o estilo musical dela, além de ser meio analfabeto em inglês, pois várias expressões e citações são ou mal traduzidas ou simplesmente "esquecidas" nos textos mostrados.
Os discursos de Ice T antes das músicas também chamam a atenção, mas a falta de legendas na maioria deles e o forte sotaque do artista (além da pouca qualidade das gravações nestes trechos) vai fazer com que a maioria daqueles que assistirem o DVD fiquem “boiando”, sem entender o forte teor político e anti-racista das opiniões do cantor.
Já os mais tarados com certeza aprovarão a “performance” da dançarina Coco em “Bring It to Pain”. Nunca uma das melhores músicas do grupo, a participação sacana e desinibida da moça acaba fazendo desse um dos pontos altos do DVD. Confiram aí!
Coco e Ice ao vivo
Claro que, com a seleção de faixas escolhidas (a grande maioria do primeiro disco, felizmente), este registro (dedicado à memória de D-Roc, falecido em 2004) fará a alegria do verdadeiro fã do Body Count, apesar dos problemas listados. Mas, para quem não tem um grande envolvimento com a banda, este DVD não irá acrescentar nada, pois não será nele que este espectador irá encontrar o melhor momento do BC, além de ficar sem conhecer direito as canções devido à falta da guitarra solo. E isto, meus amigos, é lamentável.
Nos extras, temos mais duas músicas (a saber, “Born Dead” e “Last Breath”, com o mesmo som "cambaleante" da parte principal), registros dos primeiros ensaios para a tour, um passeio com Ice pelo set de filmagens de “Law And Order”, série onde ele participa como ator, e um inacreditável vídeo chamado “Ice’s Crib”, que mostra o cantor falando ao telefone por quase dez minutos, tudo sem legendas e em um inglês quase incompreensível devido ao sotaque e às gírias. O troço é tão chato que, confesso, não consegui assistir até o fim, e nem faço muita questão.
D-Roc: RIP, man!
Se você procura uma porta de entrada ao universo do BC, não abra esta. Se já está acostumado ao poderoso e excelente som do quinteto, seja bem vindo, mas não tenha grandes expectativas.
“Body Count is in the house, motherfucker!”
Track List:
1. Body Count’s In The House/Body MF Count/Masters Of Revenge
2. Voodoo
3. A Statistic
4. KKK Bitch
5. Killin’ Floor
6. Evil Dick
7. Now Sports
8. Drive By
9. Body Count
10. Surviving The Game
11. There Goes The Neighborhood
12. The Real Problem
13. Bring It To Pain
14. Bowels Of The Devil
15. Cop Killer
16. Momma’s Gotta Die Tonight
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