Por Micael Machado
"A minha história precisa ser contada, com verdade e precisão", é o que está escrito na contracapa de My Bloody Roots: Toda a Verdade Sobre a Maior Lenda do Heavy Metal Brasileiro, versão nacional para a autobiografia do músico brasileiro Max Cavalera (Soulfly, Nailbomb, Cavalera Conspiracy e Killer Be Killed, além de, eternamente, ser um ex-membro do Sepultura), escrita pelo próprio com ajuda de Joel McIver, jornalista britânico que já colaborou para revistas como Metal Hammer, Classic Rock e Rolling Stone (além de ter escrito livros sobre Black Sabbath, Metallica, Slayer e Queens Of The Stone Age, dentre outros). Em pouco mais de duzentas páginas, Max conta a sua vida desde a infância em meio à alta sociedade paulistana (graças à situação financeira do pai, que trabalhava na embaixada italiana em São Paulo), até os primeiros trabalhos para um projeto que viria a se tornar o Killer Be Killed (que lançou seu álbum autointitulado em 2014, um ano depois da publicação do livro), passando, claro, por seu período à frente do Sepultura e sua carreira como líder do Soulfly.
A trajetória de vida do cantor e guitarrista (não só a parte ligada diretamente à música) é contada pelo artista em uma linguagem de fácil leitura, clara e direta, a qual é um pouco atrapalhada pela tradução, que usa termos que soam "estranhos" para quem é acostumado a ler/ouvir entrevistas com Max, como se fosse difícil acreditar que o músico escolheria certas palavras para descrever determinadas situações, algo compreensível visto o livro ter sido escrito claramente para o mercado norte-americano (visto a maneira como o autor se esforça para descrever lugares e artistas bem conhecidos no Brasil, mas cita quase como "de passagem" locais e pessoas que, acredito, são familiares aos leitores dos Estados Unidos, mas dos quais não sabemos muito em nosso país), e, portanto, o trabalho de tradução (por Roberto Muggiati) ter sofrido desta necessidade de "adaptação" para a nossa realidade, algo que não foi levado em conta quando da escrita do texto original.
O que não impede que My Bloody Roots seja bastante informativo e interessante mesmo para quem já percorreu outras biografias ou documentários sobre o Sepultura ou o Soulfly. As opiniões e percepções de Max sobre os acontecimentos com suas bandas (e seus diversos componentes) são, por vezes, bastante peculiares, e a visão de alguém "de dentro" ajuda a esclarecer alguns fatos sobre a carreira dos grupos por onde passou, especialmente nos episódios de separação do Sepultura (para o qual ele tem uma explicação bastante diferente daquela conhecida pelo "senso comum"), criação e posterior "aniquilação" do Nailbomb (cuja intencionalmente curta história é relatada com impressionante riqueza de detalhes) e a constante troca de integrantes no Soulfly, o qual, Max admite, é a "sua" banda, independente de quem estiver lhe acompanhando no momento.
Algumas das fotos presentes no livro
Com prefácio escrito de forma devotada e apaixonada por Dave Grohl (do Foo Fighters, que se mostra um grande fã de Max, com quem trabalhou no projeto Probot), um dos aspectos que mais enriquece o livro são os depoimentos que surgem durante o texto feitos pelos diversos músicos, produtores, empresários e jornalistas que trabalharam ou conviveram com o brasileiro ao longo de sua carreira, assim como participações importantes de sua esposa Gloria (sua empresária desde a época de Sepultura) ou dos filhos dela, todos sempre com palavras e declarações extremamente elogiosas para com a pessoa e o artista Max Cavalera, enaltecendo sua integridade, dedicação e generosidade, e desmistificando um pouco a imagem de "arrogante" que se construiu sobre o músico aqui no Brasil, especialmente depois de sua saída do Sepultura, fato que, convenhamos, nunca foi bem digerido nem pela imprensa nem pela maioria dos fãs de heavy metal em nosso país!
Aparentemente de forma bastante honesta, Max descreve, com um bom nível de detalhes, os períodos de gravações e turnês de todos os seus discos e projetos, tentando quase sempre justificar ou explicar os caminhos musicais "diferentes" pelos quais já se arriscou (como gravar com os índios brasileiros para o álbum Roots, do Sepultura, ou procurar músicos da Sérvia, Rússia, Jamaica ou Turquia para colaborarem em discos do Soulfly), bem como não se esquiva em nenhum momento de tratar de assuntos "espinhentos" como a traumática morte do pai, ainda na adolescência (a qual lhe marcou profundamente, e nunca foi totalmente superada), o assassinato do enteado Dana Wells (filho de Gloria), a morte de seu "neto" Moses (filho de sua enteada Christina) e, principalmente, sua luta contra o vício em álcool e analgésicos, que o levou a uma internação em um centro da reabilitação, e sobre o qual ele trata de forma direta e objetiva, sem rodeios ou auto-condescendências, como, aliás, tudo o mais descrito ao longo do livro.
Capa, contracapa e "orelhas" de My Bloody Roots
Apesar de surpreendentemente curto devido à quantidade de informações e de conteúdos interessantes que possui, My Bloody Roots (que possui ainda vinte e quatro páginas com fotos de Max desde a mais tenra idade até o período da escrita do livro) é leitura obrigatória não só para os fãs de Max Cavalera (mesmo que em apenas alguma época de sua carreira), mas para todos aqueles interessados na história do heavy metal em nosso país, estilo do qual Max é, sem sombra de dúvidas, o nome de maior prestígio e importância em nível mundial que o Brasil já teve (e dificilmente algum artista chegará a superá-lo algum dia). Se tiver a chance de conferir esta obra, faça um favor a si mesmo, e não a desperdice!
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