Após saírem do grupo paulista Zero, o vocalista e guitarrista Fábio Golfetti e o baterista Claudio Souza formam o Violeta de Outono em 1984, junto ao baixista Angelo Pastorello, tendo por objetivo executarem uma música que unisse suas influências de pós-punk inglês, rock progressivo e sons da psicodelia inglesa da segunda metade da década de 1960, tendo o Pink Floyd de Syd Barrett à frente. Após gravarem uma demo tape em 1985, lançam no ano seguinte, pela loja de discos Wop-Bop, seu primeiro EP, chamado Reflexos da Noite, o qual continha três músicas e levou o trio a assinar com a gravadora RCA, fazendo parte do então iniciante selo Plug, por onde a companhia lançou diversas bandas importantes do chamado BRock dos anos 80 (este EP seria relançado em CD no ano 2000, com oito faixas bônus). Começava então a trajetória de um dos mais importantes grupos psicodélicos/progressivos do Brasil, cuja discografia você confere a seguir:
Para mim, é muito difícil ser imparcial com relação ao disco de estreia do Violeta de Outono, pois o considero um dos clássicos do rock oitentista brasileiro, com uma atmosfera psicodélica (e algo de pós-punk, como na instrumental "Retorno") que o faz soar como um disco gravado na Inglaterra do final dos anos sessenta e escondido do mundo por quase vinte anos. Gosto de todas as composições da versão original em vinil, sendo, no entanto, impossível não destacar "Dia Eterno", talvez o maior clássico da carreira do grupo (e um dos maiores do período conhecido como BRock, além de ser o primeiro clipe do trio), e a versão para "Tomorrow Never Knows", dos Beatles, ainda hoje a melhor cover para uma canção dos Fab Four que eu já tive o prazer de escutar. Se "Outono" (que já havia aparecido no primeiro EP) soa como uma bela representante do rock brasileiro de meados dos anos 1980, a face psicodélica do grupo é escancarada em "Declínio de Maio", "Faces" (com melodia conduzida pelo violão), "Luz" (com uma melodia que lembra "Set The Controls For The Heart Of The Sun", do Pink Floyd) e na instrumental "Sombras Flutuantes". "Noturno Deserto" completa o track list original, e apresenta algumas percussões no começo (que chegam a lembrar o disco Larks' Tongues In Aspic, do King Crimson), algo que seria utilizado de maneira mais ampla no disco seguinte. Em 2008, foi lançada uma versão remasterizada em formato mini-vinil que acresceu quatro faixas bônus gravadas em 1987, sendo três instrumentais e um cover para "2000 Light Years From Home", dos Rolling Stones. Já em 1988, foi lançado apenas em fita K7 o EP The Early Years, com quatro regravações de bandas que influenciaram o Violeta (Rolling Stones, Pink Floyd, Gong e Beatles), sendo que o mesmo seria relançado em CD no ano de 2000 (com o acréscimo de um medley de "Echoes", do Pink Floyd, e "No Quarter", do Led Zeppelin), e ganharia ainda uma terceira versão em 2004, chamada Early Years Complete, com um total de quatorze faixas.
No seu segundo registro, o Violeta investiu em uma sonoridade um pouco mais "étnica", caracterizada pelo uso de percussão (por vezes eletrônica) em boa parte das faixas, a qual em certos casos soa muito bem (como na viajante "Outra Manhã", um dos destaques do track list), mas em outras se faz desnecessária dentro do arranjo das faixas (como é o caso da interessante "Vênus" ou da floydiana "Ilhas", que ficaria bem melhor sem este recurso, como se ouve nas versões ao vivo). Apesar de não ser um dos meus discos favoritos, posso citar como destaques, além da citada "Outra Manhã", a acústica "Terra Distante", com interessantes partes de teclado no seu arranjo, a instrumental "Dança" (bem calma, levada por violão e piano), a viajante "Lunática" e as duas faixas iniciais, "Rinoceronte Na Montanha De Geléia" e "Em Toda Parte", que na verdade fazem parte de uma mesma jam, lançada na íntegra na reedição do EP de estreia. Completa o track list da versão em vinil a psicodélica "Aqui & Agora" (meio repetitiva), sendo que a versão remasterizada em CD (também lançada em formato mini-vinil em 2008) ganhou ainda duas faixas bônus.
Devido à pouca repercussão de Em Toda Parte e ao fim do selo Plug da RCA, o trio acabou trilhando caminhos diferentes, com Fábio editando um flexi disc sob o nome de Opera Invisível (com a faixa "Numa Pessoa Só", um dos bônus da reedição em CD do segundo registro), e montando depois o Invisible Opera of Tibet, grupo ao qual se dedica até hoje. Em 1995, a formação original se reúne para ensaios visando a gravação de um novo álbum, mas acabou vendo apenas o lançamento do disco ao vivo Eclipse, com gravações do show de lançamento do primeiro EP da banda em 1986, ocorrido no teatro do SESC Pompéia em São Paulo, além de trazer as quatro faixas da fita K7 The Early Years como bônus. Finalmente, em 1999, é lançado Mulher na Montanha, composto de gravações inéditas que foram registradas durante aqueles ensaios de 1995. Mais voltado à sonoridade do primeiro disco, suas três faixas iniciais (a título, que é o maior destaque deste CD, "Lírio de Vidro", mais calma, e "Outro Lado", cuja melodia lembra a de "Em Toda Parte") foram gravadas para compor um single que nunca foi editado. "Trópico" e "Reflexos da Noite" já haviam aparecido no primeiro EP, e a interessante versão para "Astronomy Dominé", do Pink Floyd, serve para reforçar a influência dos ingleses na sonoridade do Violeta, algo que também se pode confirmar em "Espelhos Planos", que parece saída do primeiro LP do grupo de Syd Barrett. Esta e as demais oito canções que compõem o álbum foram registradas durante ensaios para o registro de uma demo tape, que acabou se tornando o novo disco do grupo, lançado pela gravadora inglesa Voiceprint. Dentre faixas mais agitadas (como "Total Silêncio", que possui trechos com o uso de cítara em seu arranjo, ou "Lágrimas Do Dragão", toda em clima de jam session, e um dos destaques), temos composições que parecem saídas do primeiro disco (como "Creme Gelado, Desculpe", que repete a letra de "Vênus", do disco anterior, porém com um arranjo bem diferente, dando ênfase ao baixo, e "Sonho", no estilo tradicional do grupo) e outras mais viajantes, como a instrumental "Duna" (que se une a "Flutuando", quase como se fossem uma única canção) e uma regravação para "Terra Distante", com trechos onde a cítara se destaca, e partes levadas pelo violão, instrumento que comanda a variada "Ilusão", que completa o track list deste que é um dos meus álbuns favoritos do grupo. No ano seguinte, sairia Live at Rio ArtRock Festival '97, com a íntegra do show do Violeta De Outono no Rio ArtRock Festival de 1997, que teve a participação especial do tecladista Fabio Ribeiro (Blezqui Zatzaz, Angra, Shaman).
Gravado durante 2002 a 2004, este é o único disco a ter Gregor Izidro na bateria, além de contar novamente com o tecladista Fábio Ribeiro, que tem bastante destaque em todas as composições. Embora as viagens psicodélicas ainda estejam presentes (vide a parte instrumental de "Eclipse" ou a regravação de "Dança", que já havia aparecido no segundo disco, mas aqui ganha toques orientais dados pela cítara e a viola), esta presença mais forte das teclas levou a sonoridade do grupo para um lado mais progressivo, como se ouve na calma "Estrelas" e na instrumental "Línguas De Gato Em Gelatina" (e vai me dizer que esse nome não é herdeiro direto de Larks' Tongues In Aspic, do King Crimson?), onde, apesar das interessantes linhas de teclado, é a guitarra de Fábio Golfetti quem comanda a melodia. Como a reforçar este lado prog, "Blues" é quase uma cover de "Money", do Pink Floyd (compare as linhas de baixo e bateria), com um toque de "One Of These Days", também dos ingleses, e onde a letra é a mesma de "Numa Pessoa Só", que saiu na reedição do segundo disco (e de partes de "Lírio de Vidro", do álbum anterior). Se "Ecos", "Cartas" e "Transe" parecem saídas do primeiro LP, a instrumental "Supernova" retoma as experiências com percussão do segundo registro (embora aqui as mesmas não sejam eletrônicas, e estejam a cargo do percussionista convidado João Parahyba, que já passou pelo Trio Mocotó e possui uma respeitada carreira solo), enquanto "Azul" e "Mahavishnu" são baladas com toques setentistas, sendo que a segunda apresenta boas linhas de violão e momentos de muita viagem progressiva através dos teclados de Fábio Ribeiro, além de uma citação à letra de "Thank You", do Led Zeppelin, em seu trecho final. "Júpiter" é outra balada, porém mais viajante, e a sessentista e (também) viajante "Moon Princess" (com a participação especial da vocalista Naide Patapas) encerra o track list, retomando a melodia de "Lunática", que também encerra o segundo LP. Ilhas é considerado um disco de transição do lado psicodélico para o lado progressivo que apareceria com força a partir do próximo registro de estúdio, mas eu o considero bem equilibrado entre os dois "mundos" por onde o Violeta sempre navegou. Em 2006, já com Cláudio Souza de volta à bateria, saiu o DVD Violeta de Outono & Orquestra, gravado ao vivo no Teatro do SESI, de São Paulo, em Novembro de 2004, e que traz o trio acompanhado de uma orquestra de câmara de 20 integrantes, uma seção de cordas (violinos, viola, violoncelo e contrabaixo) e metais (trompete, trompa e trombone), além de um set de percussão, em um resultado interessantíssimo, que vale a pena ser conferido.
Com a entrada dos novos integrantes Fernando Cardoso (teclados) e Gabriel Costa (baixo, em substituição a Angelo Pastorello), neste álbum (que viria a ser o último registro com o baterista Claudio Souza) o Violeta pendeu de vez para uma sonoridade mais progressiva (vide a faixa de abertura, "Além do Sol", onde, apesar do belo solo de Golfetti, o destaque é total para o Hammond de Fernando), embora não tenha abandonado totalmente o psicodelismo, como se nota em "Em Cada Instante" (cuja segunda parte parece saída diretamente do verão do amor californiano, além de trazer trechos que emulam os Beatles no início e no final) ou na quase totalmente instrumental "Pequenos Seres Errantes" (com teclados que remetem diretamente ao Pink Floyd da fase Meddle). A sessentista "Broken Legs" tem letra em inglês, assim como a linda balada "Eyes Like Butterflies", que já havia aparecido no DVD anterior, mas cuja presença de Fernando nesta versão de estúdio só fez engrandecer a música. Outras canções mais calmas são "Ponto de Transição" (levada pelo piano) e "Caravana", sendo que a longa faixa de encerramento, "Fronteira", tem uma espécie de jazz prog no início onde todos se destacam, tornando-se depois uma excelente e variada faixa progressiva. Um belo registro, que foi melhor detalhado neste texto publicado no site Consultoria do Rock, e que possui uma sonoridade familiar aos fãs, embora diferente dos anteriores, além de ter chamado a atenção de muitos que nunca tinham dedicado seu tempo e seus ouvidos ao grupo. Na sequência, foram lançados dois DVDs: Seventh Brings Return - A Tribute to Syd Barrett (de 2009, mas gravado em 2006), onde o Violeta escancara sua influência de Pink Floyd e de Barrett, tocando treze músicas da fase em que este liderava o conjunto britânico (mais uma de sua carreira solo); e Theatro Municipal, São Paulo, 3 de maio de 2009 (2011), com show registrado conforme o título, onde o quarteto interpretou o primeiro disco na íntegra, além de outras músicas gravadas em meados dos anos 80, e que saíram no primeiro EP do grupo (DVD este que, infelizmente, tem alguns problemas técnicos na imagem durante as primeiras músicas, o que atrapalha um pouco àqueles mais exigentes numa era onde tudo tem de ser em "alta definição" - como se nunca tivessem assistido às velhas fitas VHS em suas vidas).
Marcando a estreia de José Luiz Dinóla na bateria (em substituição a Fred Barley, que entrou após a saída de Claudio, e não chegou a deixar nenhum registro oficial) ao lado de Fábio, Fernando e Gabriel, Espectro pode ser considerado a sequência natural do disco anterior, mantendo a atmosfera progressiva daquele registro, como atestam a faixa de abertura, "Formas-Pensamento" (uma das mais longas composições já registradas pelo Violeta, e que reaparece no final em uma versão demo intitulada "News from Heaven"), "Montanhas da Mente" (que possui uma marcante mudança de andamento no meio), "Algum Lugar" e a longa "Ondas Leves" (com uma parte mais acelerada ao final e uma alternância de solos entre o Hammond de Fernando e a guitarra de Fábio). O lado psicodélico aparece na vinheta que dá título ao CD e na faixa "Anos-Luz", que também apresenta características de progressivo. "Claro Escuro" e "Solstício" possuem uma atmosfera que lembra o primeiro disco, quebrada um pouco pelo teclado, sendo que a bela balada "Dia Azul" completa o track list, em uma composição semelhante a outras do estilo presentes em discos anteriores. Até aqui o mais recente registro do quarteto, é, sem sombras de dúvidas, um dos melhores de sua carreira, e foi colocado por este que vos escreve dentre os dez melhores discos lançados em 2012 em votação aqui no site. Ainda não me arrependi de minha escolha!
Cartaz de show da época de Espectro, Na foto, Fred Barley, Fernando Cardoso, Fábio Golfetti e Gabriel Costa
O grupo segue firme e forte realizando apresentações pelo Brasil (principalmente na região sudeste), sendo que o líder Fábio Golfetti também mantém na ativa o Invisible Opera of Tibet, além de ser o guitarrista da formação atual do Gong, grupo que sempre lhe inspirou e que é liderado pelo mestre Daevid Allen. Que o Violeta de Outono continue a brilhar por muito tempo, e nos delicie com muitas outras sonoridades especiais como tem feito desde o seu início!
A foto inicial é de minha Autoria e foi cortada... LFRabatone.
ResponderExcluirOlá! Me desculpe então, a mesma foi achada na internet. Quer que a retire do post?
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