Por Micael Machado
Qual o melhor disco do século XXI? Estamos apenas nos aproximando da metade da segunda década do mesmo, mas, até aqui, a resposta para esta questão é, a meu ver, simplesmente óbvia: nestes quatorze anos, nenhum álbum conseguiu me cativar mais do que Wolfmother, a estreia da homônima banda australiana capitaneada pelo vocalista e guitarrista Andrew Stockdale, lançada em 2005 no país natal do então trio, para depois conhecer o mundo ao longo do ano seguinte, com um track list rearranjado e a inclusão de uma faixa extra para o mercado internacional. Há tempos um álbum de uma banda nova não me empolgava tanto desde a primeira audição, e, até aqui, nenhum outro conseguiu a mesma façanha.
Surgido em 2000 na cidade de Sydney, e tendo Chris Ross (baixo e teclados) e Myles Heskett (bateria) como colegas do chefão Andrew, o grupo começou a obter mais destaque em 2004, ao assinar com a gravadora Modular Recordings, sediada em seu país natal. Em setembro daquele ano, sairia seu primeiro EP, também intitulado Wolfmother, com quatro canções que depois seriam regravadas para o disco de estreia do grupo, gravado em apenas duas semanas no famoso estúdio Sound City, em Los Angeles, sob a produção de Dave Sardy (que já havia trabalhado com grupos como Slayer, Jet e Oasis), e lançado na Austrália a 30 de outubro de 2005, aparecendo no mercado mundial no decorrer de 2006, em datas diversas dependendo do país de lançamento.
Nas treze faixas da versão "estrangeira" de Wolfmother (cuja linda capa deriva da obra The Sea Witch, do artista Frank Frazetta), o trio se mostra claramente influenciado pelo melhor do hard rock setentista, como comprovam a suingada "Witchcraft" e seu belo solo de flauta (executado pelo músico convidado Dan Higgins, mas que poderia muito bem ter sido gravado por um Thijs Van Leer ou um Ian Anderson, para não citar seu empolgante refrão), a acústica "Vagabond", que parece saída das sessões de Led Zeppelin III, ou a agitada "Dimension", que possui um trecho mais lento no meio que não soaria deslocado em um dos primeiros discos do Black Sabbath - tudo isso sem mencionar "Where Eagles Have Been", que chega a parecer um tributo à carreira do Led Zeppelin ao longo de seus variados cinco minutos e meio. O grupo também apresenta neste debut forte influência do psicodelismo inglês da década de 1960, como se pode confirmar no final de "White Unicorn" ou na viajante "Mind's Eye".
O Wolfmother em 2005: Myles Heskett, Andrew Stockdale e Chris Ross
"Joker & the Thief", um dos seis singles retirados do registro, e também um de seus maiores destaques, reúne perfeitamente estes dois lados dos australianos, o que não impede que composições mais simples como a pesada e monolítica "Colossal" (que, ainda por cima, ganha uma parte extremamente veloz mais perto do final), "Apple Tree" (que soa como uma sobra de algum álbum dos White Stripes) ou "Woman" (que fez parte da trilha do jogo Guitar Hero II, e possui um solo de teclado totalmente maluco na sua parte intermediária) consigam seu próprio destaque em meio a faixas tão empolgantes. O mesmo acontece com a suingada "Love Train", a "faixa extra" exclusiva para o mercado internacional, e que sempre me lembrou um pouco o início do T. Rex, não sei bem por quê.
A fascinante "Pyramid" possui um riff repetitivo e bastante pesado, reforçado pela distorção aplicada ao baixo, e uma melodia de guitarra que transpassa a música quase substituindo o vocal em certos momentos, com o track list sendo então completado por "Tales", que não é uma versão para a música de mesmo nome registrada pelo Uriah Heep, mas sim uma bela composição que reúne com perfeição o lado viajante e o lado hard setentista do trio australiano. A título de registro, cabe citar que existem ainda duas outras versões do álbum, ambas norte-americanas: uma que acrescenta "Colossal", em versão ao vivo no festival Big Day Out, e outra que possui remixes para "Woman" e "Love Train", totalizando assim quinze faixas.
Infelizmente, a altíssima qualidade do álbum não foi sinônimo de uma carreira de sucesso para o Wolfmother, e, após a turnê de divulgação do mesmo, Ross e Heskett deixaram Andrew sozinho com o nome do grupo, devido a divergências musicais e pessoais. O compositor não se intimidou, remontou a banda como um quarteto, e lançou em 2009 o regular Cosmig Egg, que, apesar de inferior à estreia, também renderá boas audições a quem se dispuser a ouvi-lo. Esta segunda encarnação também não durou muito, com Stockdale partindo para uma carreira solo (iniciada pelo irregular, mas interessante, Keep Moving, de 2013, composto por faixas que deveriam estar no terceiro disco do Wolfmother), a qual foi logo abortada para ver surgir uma terceira encarnação do grupo do qual o vocalista e guitarrista é, por mérito e direito, o dono da bola, desta vez com a volta do baixista Ian Peres (que esteve na segunda versão) e a chegada do baterista Vin Steele, completando assim uma nova formação em trio para os australianos.
Contracapa da versão internacional de Wolfmother
Que Andrew Stockdale consiga resolver seus problemas com os músicos que lhe acompanham, e siga registrando mais discos de qualidade como tem feito ao longo dos anos (como o recente New Crown, de março deste 2014). Mesmo que nenhum deles chegue a superar sua maravilhosa estreia (algo bastante improvável, a meu ver), com certeza renderão vários bons momentos auditivos. Ao menos, é no que acredito.
She's a woman, you know what I mean... She's gonna set you free!
Track List (versão internacional):
1. "Dimension"
2. "White Unicorn"
3. "Woman"
4. "Where Eagles Have Been"
5. "Apple Tree"
6. "Joker & the Thief"
7. "Colossal"
8. "Mind's Eye"
9. "Pyramid"
10. "Witchcraft"
11. "Tales"
12. "Love Train"
13. "Vagabond"
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