sábado, 23 de agosto de 2025

Ministry – Hopiumforthemasses [2024]


Por Micael Machado

Três anos depois de Moral HygieneAl Jourgensen e seus asseclas estão de volta com um novo álbum do Ministry, o qual, arrisco a dizer, corre grande risco de ser o melhor disco da banda desde Houses Of The Molé, de 2004. Além de ter mais riffs marcantes e músicas interessantes do que seus últimos lançamentos (que estavam longe de serem ruins, mas, honestamente, ficavam um nível abaixo do "padrão de qualidade" que a banda nos acostumou durante a década de 1990), o "chefão" Al parece ter ouvido os discos antigos do grupo e resgatou deles o uso de samplers com vozes e citações retiradas de filmes, discursos políticos e programas e noticiários de TV, os quais se integram nas músicas e acabam se tornando parte das letras das mesmas, embora não constem nos textos do encarte. Estes samplers aparecem com ênfase nas duas primeiras faixas, a pesada e arrastada "B.D.E." (iniciais de "Big Dick Energie", cuja letra critica aquilo que, aqui no Brasil ficou conhecido como "cultura Red Pill") e a rápida (e altamente indicada para quem gosta do estilo Metal Industrial praticado pelo Ministry) "Goddamn White Trash", que conta com participação de Pepper Keenan, do Corrosion Of Conformity, nos vocais, e cuja letra se posiciona contra os supremacistas brancos que assolam os Estados Unidos atualmente, além destes efeitos também terem destaque em "TV Song 1/6 Edition", uma das faixas mais rápidas do disco, e, possivelmente, a que mais lembra os "bons tempos" de discos como The Mind Is A Terrible Thing To Taste ou Psalm 69.

Outra que parece saída de um destes dois álbuns é "Just Stop Oil", quase uma "nova versão" da clássica "Just One Fix", e cuja letra alerta (mais uma vez) para os perigos do aquecimento global. Já "New Religion", que tem um dos melhores riffs do álbum, parece vinda de uma fase um pouco posterior, da época do citado Houses Of The Molé ou de seu anterior, Animositisomina. "Aryan Embarrassment" é marcada e pesada, além de trazer novamente a participação especial de Jello Biafra (ex-vocalista dos Dead Kennedys) nos vocais, além de possuir uma das letras mais fortes do disco, com Jello novamente criticando os supremacistas brancos norteamericanos sem nenhuma papa na língua, em frases como "Como as pessoas podem concordar com isto? A democracia se transforma em poeira, em uma guerra ao voto que faz a América odiar novamente. É tudo tão estúpido!".

Alguns dos músicos que participaram das gravações de HopiumforthemassesMonte Pittman (guitarras/baixo), John Bechdel (teclados), Paul D'Amour (baixo), Al Jourgensen (vocais, guitarras e programações), Roy Mayorga (bateria) e Cesar Soto (guitarras/baixo)

Como nos álbuns mais recentes, as letras das músicas são muito importantes para passar a visão que Al tem do mundo atual, a qual pode ser resumida em frases como "Esta é nossa realidade/Este é o fim de nossa sociedade/Parece ser o fim dos tempos/E não é bonito", que ele canta em "It's Not Pretty", outra faixa veloz (com mais um riff bastante interessante), mas que começa de forma leve e acústica, quase confundindo os mais desinformados na carreira do grupo. Quase todas as faixas tem um alvo específico, os quais, além dos já citados acima, também atacam a extrema direita que toma conta da política mundial (em "TV Song 1/6 Edition"), o mercado de capitais que guia os verdadeiros rumos do mundo (em "New Religion") e até contra a guerra Rússia x Ucrânia, em "Cult of Suffering", que traz os vocais de Eugene Hütz, do Gogol Bordello, em uma faixa com trechos cantados em ucraniano, e cuja letra no encarte estampa a frase "Ministry apoia a Ucrânia" na página onde ela aparece.

Assim como no disco anterior, Al Jourgensen (que, aqui, além da produção e dos vocais, também se ocupa de guitarras, baixo, teclados e programações) optou por não ter uma formação fixa para o seu Ministry, embora a maioria dos músicos envolvidos na gravação de Hopiumforthemasses também tenham participado de Moral HygieneMichael Rozon (responsável pelas programações e alguns teclados) e o guitarrista e baixista Cesar Soto ainda são os "parceiros de crime" mais constantes ao longo das faixas, mas desta vez, Cesar divide as funções quase igualmente com Monte Pittman, guitarrista que já tocou com Prong, Body Count e até com a diva Madonna (ela mesma). Roy Mayorga volta a empunhar as baquetas do Ministry (desta vez em três faixas), assim como Paul D'Amour se ocupa do baixo em uma música (e da guitarra em outra) e John Bechdel se encarrega dos teclados em outra. Além dos convidados já citados nos vocais, também temos as participações (em diferentes faixas) do guitarrista Billy Morrison, do tecladista Charlie Clouser, além de vocais adicionais de músicos como Atticus Pittman, Liz Walton, Victoria Espinoza, Dez Cuchiara e Joshua Ray.

Contracapa de Hopiumforthemasses

A citada "Cult of Suffering" é, musicalmente, uma das faixas mais "diferentes" do disco, com um ritmo mais leve e até algum suingue, em uma composição que dá destaque ao que parece soar como um órgão Hammond (tocado, seguindo o encarte, pelo próprio Jourgensen) e que soa quase como uma inofensiva composição pop, e que só não é mais "estranha" no contexto do disco do que a faixa de encerramento, "Ricky's Hand", cover do cantor britânico Fad Gadget (do qual, confesso, eu nunca tinha ouvido falar anteriormente) totalmente eletrônico, com um ritmo quase dançante (e praticamente sem a participação das guitarras) que remete à fase inicial da carreira do Ministry, onde o grupo se dedicava muito mais o synth-pop da época (início dos anos 1980) do que ao metal industrial que adotaria no final daquela década e início da seguinte. Esta fase, inclusive, foi "revisitada" em The Squirrely Years Revisited, álbum de regravações lançado no início deste 2025, o qual, infelizmente, ainda não teve edição nacional. Ainda em 2024, Jourgensen declarou que o próximo álbum de inéditas seria o último da carreira do grupo, além de marcar o retorno do baixista Paul Barker, que fez parte da formação da banda entre 1986 e 2003, e foi o principal parceiro de composições de Al nos "tempos áureos" do grupo. Nem uma coisa nem outra foram confirmadas enquanto escrevo este texto, mas o fato é que, com o retorno de Donald Trump (antigo desafeto de Jourgensen) à Casa Branca e com o mundo cada vez mais pendendo para o lado da extrema direita, duvido que o líder do Minstry vá abandonar sua principal plataforma de comunicação. Afinal, como ele mesmo canta em "Just Stop Oil", "Nós temos algo a dizer, e não há mais como adiar"! Afinal, o mundo, certamente, ainda precisa das letras (e das músicas) do Ministry para tentar acordar!

Track List:

1. B.D.E.
2. Goddamn White Trash
3. Just Stop Oil
4. Aryan Embarrassment
5. TV Song 1/6 Edition
6. New Religion
7. It's Not Pretty
8. Cult Of Suffering
9. Ricky's Hand

Monster Magnet – 25............TAB [1991]

Por Micael Machado

Existem certos discos que exigem uma "dedicação" maior de quem se dispõe a lhes escutar, pois a audição dos mesmos pode ser bastante "complicada" e "difícil" para este corajoso ouvinte. Metal Machine Music, de Lou Reed, e Arc, de Neil Young, se encaixariam nessa categoria, pois são, basicamente, ruídos de feedback e distorções de instrumentos reunidos em uma "canção" contínua composta, basicamente, apenas de "barulhos"... Certamente, há outros exemplos de álbuns com estas características, e um deles foi gravado pela banda norte-americana Monster Magnet em 1991, mas foi lançado no país de origem do grupo apenas em 1993...

Tendo lançado duas demos como um trio ainda no ano de sua fundação, em 1989, o Monster Magnet registrou um single de estreia para a gravadora Circuit Records no ano seguinte (já como quarteto), e um EP de seis faixas também em 1990 pela gravadora alemã Glitterhouse Records, antes de assinar com o selo Caroline Records (na época, estabelecido nos Estados Unidos), o qual lançou o single "Murder/Tractor" pela sua subsidiária Primo Scree também em 1990. Com a boa repercussão do single, a Caroline autorizou a banda a entrar no estúdio para gravar seu primeiro álbum, mas as três faixas resultantes (totalizando mais de 48 minutos) acabaram rejeitadas pela gravadora, fazendo com que o quarteto (formado, então, por Dave Wyndorf nas guitarras e vocais, John McBain na guitarra solo, Tim Cronin no baixo e Jon Kleiman na bateria) voltasse ao estúdio (não sem antes repor Cronin, que passou a cuidar da parte de luzes dos shows ao vivo, pelo baixista Joe Calandra) para gravar novas composições (além de regravar duas faixas de seu primeiro EP e registrar uma cover para "Sin's A Good Man's Brother", do Grand Funk Railroad) e lançar, já em 1991, seu álbum de estreia, chamado Spine of God. Uma turnê pelos EUA em suporte ao Soundgarden para divulgação do primeiro disco completo do Monster Magnet chamou a atenção da gravadora A&M Records, que assinaria com a banda em 1992 e lançaria seu segundo full lenghtchamado Superjudge, no começo de 1993.

A melhor divulgação da major A&M e a boa recepção do público ao segundo álbum do Monster Magnet acabaram levando o nome da banda a plateias maiores, fazendo o grupo ser considerado um "sucesso menor" nos EUA, e um dos precursores do Stoner Metal no país. Quando viu o quarteto em alta nas paradas, aparentemente, a gravadora Caroline "se lembrou" daquelas faixas rejeitadas de 1991, e decidiu lançar as mesmas nos Estados Unidos, no formato de um EP de três faixas chamado 25............TAB, naquele mesmo 1993. O mini-álbum já havia sido lançado na Alemanha pela citada Glitterhouse Records ainda em 1991, mas foi somente com a versão da Caroline (a qual, inclusive, conta com uma capa diferente da versão européia original) que a bolachinha acabou chegando de vez ao grande público.

Capa da versão alemã original de 25............TAB

Se você conhece o Monster Magnet pelos álbuns gravados após este EP, não espere encontrar aqui quase nada do que está acostumado. Se, após Spine of God, o Imã de Monstros se tornaria um dos pilares do Stoner Rock norte-americano, aqui o quarteto ainda era uma banda muito mais voltada a uma sonoridade "psicodélica" e "viajante". No encarte de uma das muitas reedições posteriores, Wyndorf escreveu nas "liner notes" que o grupo "estava ouvindo muito Hawkwind, Amon Duul II, Alice Cooper e Skullflower quando compomos este disco". Os pouco mais de quatro minutos de "Lord 13", a menor faixa do EP, são possivelmente a coisa mais "acessível" do álbum, embora passem longe do estilo que a banda adotaria depois (soando quase como algo das bandas psicodélicas de San Francisco do final dos anos 60, com sua percussão e sonoridade quase acústicas). Já os mais de doze minutos de "25/Longhair" são divididos em uma faixa rápida e mais focada na guitarra durante "25" (que ocupa aproximadamente os oito primeiros minutos da canção) e um pouco mais cadenciada em "Longhair", uma jam instrumental que talvez seja a música deste EP com o estilo mais próximo da sonoridade que o grupo iria adotar em seus lançamentos posteriores, e que, infelizmente, termina com um "fade out" que nos deixa com vontade de escutar mais desta canção.

Embora  "25" tenha algumas "viagens lisérgicas" ali pelo meio, acredito que nada prepare o ouvinte para o que ele irá escutar nos mais de trinta e dois minutos da faixa de abertura, intitulada "Tab". Sobre uma sólida e repetitiva base formada pelo baixo e pela bateria, guitarras "viajantes" se misturam a efeitos eletrônicos e distorções diversas, além de vocalizações quase orientais e falas diversas (e distorcidas por efeitos sonoros variados, como ecos e repetições), formando uma das faixas mais abstratas e "psicodélicas" que eu já ouvi de uma banda (supostamente) de hard rock, e a qual é impossível descrever em detalhes aqui. No mesmo encarte citado antes, Wyndorf explica que " 'Tab' foi uma das primeiras coisas que fizemos como banda. Há uma versão realmente crua dela em nossa primeira demo, e (para a versão que saiu no EP) foi feita apenas uma mixagem dela, devida à sua duração e porque não tínhamos muito dinheiro para gravar". Ainda nessas "liner notes", o vocalista explica que o EP "foi a última coisa que Tim (Cronin) gravou antes de passar para a parte de iluminação", e que "não tocamos muita coisa desse álbum ao vivo (depois de gravá-lo), acho que fizemos '25' umas duas vezes, e foi só".

Contracapa da versão americana de 25............TAB

Como escrevi acima, o EP chegou a ser lançado na Alemanha (em vinil e CD) ainda em 1991 (dois anos antes de seu lançamento oficial nos EUA, portanto). Ele foi relançado pelo selo Steamhammer em 2006, também na Alemanha, com uma versão ao vivo da faixa "Spine Of God" como bônus (a mesma versão seria relançada em 2017 pela Napalm Records tanto na Europa quanto nos EUA), sendo que existe ainda uma versão da Caroline Records (presumidamente de 1994) que agregou o single "Murder/Tractor" às três faixas originais, embora as faixas do compacto apareçam como "hidden tracks" na versão em CD (que, particularmente, é a que possuo). Seja em qual edição for, tenho certeza que nada irá lhe preparar para o estranhamento de ouvir algo como "Tab". Encare por sua própria conta e risco, e, caso enfrente o desafio, tenha uma boa "viagem sonora". Afinal, como diz uma nota no encarte de Spine of God, "it's a satanic drug thing... you wouldn't understand" (deixo a tradução para vocês...).

Track List:

1. Tab

2. 25 / Longhair

3. Lord 13